Educação

Desafios da formação integrada

Desde que veio à tona em 1996, a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) sempre tocou na questão do oferecimento de uma educação flexível com currículo que integrasse as dimensões do trabalho, ciência, cultura e tecnologia, ou seja, uma formação integrada. No entanto, sabe-se que o Ensino Médio, na prática, é voltado completamente para o mercado de trabalho e vestibular. Além disso, a formação educacional é pautada pela dualidade formação profissional x formação intelectual. A uns poucos lhes é dado acesso à uma educação voltada a conteúdos de formação intelectual e a outros, a maioria, apenas uma formação técnica.

 

Outrossim, cabe ressaltar que a “cultura pedagógica” do Brasil ainda é majoritariamente aquela no qual os conteúdos são separados em disciplinas lineares, o que não incentiva os alunos a constatarem que todos os conhecimentos são produzidos em um contexto social, político e econômico. Tampouco poderão relacionar as dimensões do trabalho e ciência como coisas totalmente interdependentes. Em resumo, o currículo das escolas brasileiras está aquém do que se entende e se espera por Ensino Médio Integralizado.

 

Como forma de amenizar o imbróglio, é importante refletir que essa ideia de integração curricular é recente no Brasil. O tema apenas emergiu em 2004 com o decreto 5154/2004, apesar de já aparecer subjetivamente no texto da LDB anos antes. Porém, começou a se ampliar em 2008 com a criação dos institutos federais de ensino, que passaram a oferecer cursos técnicos integrados ao Ensino Médio. De lá para cá, novos decretos foram moldando essa ideia, bem como à LDB foram adicionados novos conceitos. O caminho ainda é longo em relação à aplicação dessa prática nas escolas brasileiras.

 

Entende-se por integração formativa a organização dos conhecimentos de forma que os conceitos sejam apreendidos como sistemas de relações. É uma educação que pretende ser omnilateral, no qual trabalho, ciência, cultura e tecnologia são dimensões insociáveis. A sua finalidade é formar cidadãos com autonomia intelectual e pensamento crítico. O aluno, nesse sentido, poderá compreender melhor o que aprende porque facilmente o pode associar à realidade em que está inserido. Esses objetivos vão de encontro com as ideias propagadas por autores como Gramsci e Marx, que objetivavam uma formação emancipatório dos sujeitos.

 

A partir dessas concepções e constatações, muitos pesquisadores têm se debruçado em analisar e tentar compreender as possibilidades e limitações quanto à implementação de um currículo integralizado. Um grupo de professoras do Instituto Federal Catarinense composto por Oliveira, Souza e Brandt (2014) decidiram discorrer sobre como estava se desenvolvendo a integração curricular entre o Ensino Médio e o técnico em Agropecuária a partir da concepção que os professores do referido curso tinham de suas experiências.

 

As pesquisadoras constataram que os professores, embora não tenham domínio dos conceitos de formação integralizada, acreditam na proposta. As limitações se encontram principalmente na compreensão teórica do tema e nos modos de operacionalização. 60% dos professores que compõem o corpo docente são formados em “áreas duras”, como matemática, biologia e química. Ou seja, é um tipo de formação que dificilmente fomenta a integralização. Além disso, 40% desses professores não possuem o hábito de planejar coletivamente, apesar de indicarem que a instituição promove momentos para socialização, bem como apontarem que a organização do curso favorece o processo de integralização. Ou seja, parece haver uma resistência, embora se entenda a importância do tema.

 

Outro artigo que versa sobre a integração curricular em cursos técnicos é o de Souza (2014), professora do Instituto Federal do Paraná. Ela faz uma análise documental dos Projetos Pedagógicos dos cursos de Administração e Cooperativismo, além de observar as atividades pedagógicas desenvolvidas. Constatou-se que, apesar do curso ter avançado na questão dos conceitos e documentos, ainda precisa melhorar bastante, já que a matriz curricular dos referidos cursos apresenta os conteúdos separados por componentes curriculares.

 

Ademais, observou-se que a carga horária de cada componente é baixa, o que acaba tornando o planejamento engessado e dificultando ações conjuntas. Alguns componentes importantes, ainda, aparecem apenas em alguns períodos. Também se verificou, a partir dos relatos de professores, que os docentes das áreas gerais têm dificuldade de estabelecer relações com conteúdos das áreas específicas e vice-versa. Essa questão corrobora a problemática das formações duras, já citado anteriormente. Os professores foram formados a partir de um currículo linear dividido em disciplinas, logo é realmente difícil desenvolver uma prática integralizada nesse contexto.

 

Consoante a isso, precisa-se compreender que um currículo integrado não se dá de forma imediata. Ele se desenvolve a partir do planejamento que deve envolver o esforço coletivo dos sujeitos. A professora Lenina Borges do Instituto Federal de Santa Catarina, em seu trabalho apresentado nos Encontros Pedagógicos do IFPB em 2017, indica que esse planejamento deve acontecer a partir de 5 momentos, a saber: (i) sensibilização – analisar as possibilidades de integração; (ii) planificação – verificar conteúdos afins que possibilitem a integração; (iii) decisão – planejar as atividades indicando o “quando”, “onde”, “como” e “o que”; (iv) implementação – aplicar as atividades planejadas e (v) avaliar as atividades buscando fazer alterações e melhoramentos.

 

Bibliografia

 

OPES, Lenina. Práticas de integração curricular e interdisciplinaridade na educação profissional. In: Encontros pedagógicos do IFPB, 2017, Instituto Federal da Paraíba. [S.l.: s.n.], 2017. p. 1-7.

 

OLIVEIRA, Rosângela de Amorim T. de; SOUSA CARVALHO DO NASCIMENTO, Franc-Lane; GRAZIELE BRANDT, Andressa. Integração curricular nos cursos de ensino médio integrado em pecuária: percepções e práticas pedagógicas. In: XVII ENDIPEA Didática e a Prática de Ensino nas relações entre escola, formação de professores e sociedade, 2014, Universidade Federal do Ceará, 2014. p. 1-13.

 

SOUZA, Fernanda Ribeiro. A integração curricular na educação profissional e técnica: um relato de experiência no Instituto Federal do Paraná, campus avançado Coronel Vivida. In: IV Congresso Nacional de Educação, 2014, João Pessoa – PB. Centro de Convenções de João Pessoa: [s.n.], 2014. p. 1-9.

 

Maycon Miliorini